Dez grandes guitarristas do rock alternativo

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O rock alternativo surgiu no final da década de 1970, influenciado pelo movimento punk. Artistas que não tinham espaço nas grandes gravadoras e se opunham ao rock que dominava as paradas passaram a se organizar e lançar seus discos em pequenas gravadoras independentes. Nos anos 1980, essas bandas e gravadoras proliferaram e o estilo alternativo, também chamado de indie, se consolidou como uma possibilidade de resistência ao mainstream. A sonoridade alternativa, embora multifacetada, carregava alguns elementos marcantes, como uma roupagem mais suja e a negação do virtuosismo e do estrelismo. Tudo mudou com a explosão comercial do Nirvana em 1991, que deu origem ao movimento grunge. Grandes gravadoras passaram a se interessar pelas bandas alternativas e o gênero se tornou o centro das atenções por alguns anos. Ao final da década, o entusiasmo já tinha se arrefecido, mas o estilo alternativo passou a ser reconhecido como um gênero relevante. Como efeito adverso, o termo “alternativo” passou a ser usado indiscriminadamente para bandas muito diversas e enfraqueceu o seu potencial discriminador. Mas isso é papo pra outro artigo. Hoje o que quero enfatizar é o papel de grandes guitarristas no mundo alternativo, artistas que ajudaram a desenvolver uma sonoridade riquíssima e influente ao longo dos últimos quarenta anos.

Escolher somente dez nomes é um desafio, e fiquei mas de um mês nesse processo. Ao final do post apresento uma lista de importantes guitarristas que ficaram de fora. Mas vamos agora à lista final, apresentada sem nenhuma ordenação especial.

Courtney Barnett: Um dos grandes nomes do indie rock contemporâneo, a cantora, compositora, dona de gravadora e guitarrista (ufa!) australiana se destaca por riffs e solos deliciosamente sujos e carregados de distorção, letras irônicas e perspicazes e vocais peculiares. Toca sem palheta e faz uso de vários pedais de efeitos, construindo um estilo peculiar e irresistível. Além de dois EP´s e dois LP´s lançados até o momento (o último em 2018), também fez uma dobradinha memorável com outro grande guitarrista do mundo indie, Kurt Vile, em Lotta sea lice (2017).

Destaques: “Kim´s caravan”, “Small poppies” e “Hopefulessness”,

Thurston Moore (Sonic Youth): Juntamente com os outros instrumentistas do Sonic Youth, Lee Ranaldo (guitarra) e Kim Gordon (baixo e guitarra), Moore expandiu as possibilidades de como o instrumento poderia ser tocado. Usando afinações excêntricas e explorando o barulho gerado pela inserção de chaves de fenda e outros acessórios nas guitarras, Moore e cia criaram clássicos que misturam melodias assobiáveis e uma avalanche sonora assustadora. Após o fim da banda, em 2011, Moore prosseguiu em uma carreira solo consistente.

Destaques: “Teenage riot”, “Dirty boots” e “Rain tin”.

J.Mascis (Dinosaur Jr.): Não dá pra falar de rock alternativo sem mencionar o Dinosaur Jr. A ultrainfluente banda de Boston é um ícone do gênero, e seu líder J. Mascis é o antiguitar hero por definição. Mascis bebia tanto da fonte do punk e do rock clássico (especialmente Neil Young) quanto do heavy metal, e mostrou que o virtuosismo poderia se encaixar numa postura indie sem quebrar os alicerces e os princípios que vieram do punk. De 1985 a 1998, o Dinosaur Jr. lançou uma série de álbuns clássicos. Após alguns anos de separação, retornaram em 2005 com uma série de discos marcantes, com solos ainda mais longos e épicos.

Destaques: “Freak scene”, “Feel the pain” e “Sludgefeast”.

Nels Cline (Wilco): Com background jazzístico, Cline foi uma aquisição de peso feita em 2007 por Jeff Tweedy para se agregar ao Wilco, banda icônica do alt country mundial. Cline se enxaixou como uma luva e agregou seus solos marcantes e timbres climáticos às composições de Tweedy. O solo bombástico e extasiante de mais de 4 minutos em “Impossible germany” se tornou o ponto alto dos shows da banda.

Destaques: “Impossible germany”, “Art of almost” e “Bright leaves”.

Carrie Brownstein (Sleater-Kinney): Os duelos de guitarra endiabrados de Brownstein e Corin Tucker são a marca registrada do Sleater-Kinney, uma das mais renomadas bandas do punk/indie americano. Enquanto Tucker afina seu instrumento uma oitava abaixo (fazendo as vezes de baixo), Brownstein se encarrega dos riffs e solos frenéticos que carregam as letras politizadas da banda.

Destaques: “Entertain”, “Jenny” e “One more hour”.

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Kevin Shields (My Bloody Valentine): Excêntrico e perfeccionista, Shields é um dos mais inovadores guitarristas de sua geração. O oceano de distorção que ele é capaz de criar com sua guitarra – usando camadas sampleadas e manipulações no tremolo que entram e saem da afinação – deu origem ao movimento shoegazer e a uma infinidade de imitadores. A obra-prima Loveless (1991) (que ele demorou mais de dois anos pra finalizar) estabeleceu um padrão tão alto que ele demorou 22 anos para lançar outro disco, o também ótimo MBV.

Destaques: “Soon”, “Feed me with your kiss” e “You made me realize”.

Jonny Greenwood (Radiohead): pilar criativo de uma das melhores bandas da história (juntamente com Thom Yorke), o tímido e irrequieto Greenwood tenta ao máximo escapar do rótulo de guitar hero e ao longo da carreira investiu crescentemente nos experimentos com outros instrumentos, se tornando um estupendo compositor e arranjador para peças orquestrais. No entanto, fica difícil olhar pra trás e não se esquecer dos espasmos gloriosos de “Creep”, do solo aterrorizante de “Paranoid Android” e das variações inebriantes de “Just”, somente alguns dos exemplos da versatilidade, agressividade, criatividade e técnica apurada de Jonny – que elevaram o Radiohead ao panteão do rock alternativo.

Destaques: “Paranoid android”, “Just” e “Creep”.

Johnny Marr (The Smiths): provavelmente o guitarrista alternativo mais reconhecido dentro do mainstream guitarrístico mundial, Johnny Marr foi o coprotagonista (junto com Morrissey) de uma das bandas mais originais da história, que durou menos de seis anos e produziu uma infinidade de clássicos como “How soon is now”, “This charming man”, “There is a light that never goes out” e “Bigmouth strikes again”. Magnífico nos arranjos e no estilo jangle sessentista, com frases complexas em tons mais altos, Marr ainda teve uma carreira pós-Smiths cheia de destaques ao fazer parcerias com bandas como The The, Modest Mouse e The Cribs, montar o duo Electronic e, mais recentemente, se aventurar como cantor em três discos solo.

Destaques: “How soon is now”, “This charming man” e “Still ill”.

St Vincent: Annie Clark (que adotou o pseudônimo artístico de St Vincent) é uma das mais criativas mentes do art rock mundial. A garota do Texas aprendeu a tocar vários instrumentos ainda menina, participou de turnês com o tio que tinha um duo de jazz com a esposa – e que lhe deu preciosas lições de guitarra – e freqüentou por três anos o Berklee College of Music (Boston), completando sua formação com toques clássicos. Embora tenha um talento absurdo e um estilo muito peculiar como guitarrista, Annie não desenvolveu sua carreira em torno desse virtuosismo, preferindo construir um estilo eclético, mutável e imprevisível. Suas letras cerebrais, arranjos pouco ortodoxos, vocais arrebatadores e pegada pop fazem dela uma peça inclassificável dentro do cenário pop atual.

Destaques: “Masseduction”, “Los Ageless” e “Cruel”.

Andy Gill (Gang of Four): O mais antigo da lista, Gill criou um estilo marcante que fez com que o termo “angular” passasse a ser um descritor do som de guitarras. Gill atacava o instrumento de forma irregular e agressiva, gerando torrentes de barulho maquinal que combinavam perfeitamente com a base funkeada e dançante de seus companheiros de banda. Um dos guitarristas mais influentes da geração pós-punk (endeusado por bandas como Titãs e Red Hot Chili Peppers), deixou um vazio enorme com sua morte no mês passado, aos 64 anos.

Destaques: “Damaged goods”, “At home he´s a tourist” e “Paralysed”.

Nomes essenciais que ficaram de fora: Kurt Cobain (Nirvana), Doug Martsch (Built to Spill), Mary Timony (Autoclave, Ex Hex e outras bandas), PJ Harvey, Liz Phair, Adrianne Lenker (Big Thief), D. Boon (Minutemen), Bernard Sumner (Joy Division e New Order), Joey Santiago (Pixies), Kim Deal (The Breeders), Adam Gradunciel (The War on Drugs), John Squirre (Stone Roses), Bob Mould (Husker Du e Sugar), Grahan Coxon (Blur), Peter Buck (R.E.M.), Stephen Malkmus (Pavement) e Will Sergeant (Echo and the Bunnymen).

Daniel Rezende

Daniel Carvalho de Rezende é professor da área de Comportamento do Consumidor na Universidade Federal de Lavras (Minas Gerais). Desenvolve pesquisas sobre consumo cultural no âmbito dos cursos de mestrado e doutorado em administração. Entre os artigos científicos que já publicou sobre o tema, destacam-se: “As expressões do girl power na série Game of thrones”, “Consumo e distinção social no campo cultural da música: um estudo em Minas Gerais” e “'Pra nós, todo o amor do mundo': formação de identidade e consumo musical dos fãs da banda Los Hermanos”. Apaixonado por rock, já escreveu dois livros que abordam essa temática: Rock alternativo: 50 álbuns essenciais, publicado em 2018, e Rock Feminino, lançado em 2019.

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