Valmir Zuzzi: o pesquisador de guitarristas

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Há três anos, Valmir Zuzzi segue em uma Cruzada: escrever um livro sobre todas as guitarristas brasileiras. O propósito, que começou sem propósito nenhum, se tornou um grande compêndio com mais de 220 mulheres guitarristas.

Aos 57 anos, Valmir tem um histórico de sucesso à frente da gravadora Rock Company. Lançou 41 álbuns, alguns também em vinil, além de músicos renomados, novos e internacionais. Seu trabalho com a música começou em 1992 quando, a convite de Silvio Luporini Segundo, criou em São Carlos a Rock Company Records, que até hoje é seu trabalho e sua obra.

Nesta entrevista, você conhece um pouco mais do produtor, escritor e pesquisador Valmir Zuzzi. Confira!

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Vivian Guilherme: Como surgiu a ideia de escrever um livro sobre mulheres guitarristas?

Valmir Zuzzi: Era pra ser o segundo livro, estava focado junto com um fotógrafo num acervo com cerca de 5 mil negativos de 98 artistas dos anos 70. Em março de 2017, esse fotógrafo faleceu, o acervo de negativos inéditos ficou comigo, mas engavetei o projeto. Em maio de 2017, decidi entrar de cabeça no livro das guitarristas. A ideia era falar da época em que era comprador de discos de rock, das bandas femininas, dos 25 anos do selo e precisava de um assunto diferente para completar o livro e deixar um motivo para uma sequência, então pensei nas mulheres guitarristas brasileiras.

– E como foi o processo?

Comecei a conversar com duas guitarristas americanas para entender a cena lá fora e fazer um paralelo com a nossa cena. Quando comecei a conversar com as brasileiras, de cara pediram pra falar, alegaram precoceito, machismo, comparações, não saem nas revistas, não tocam nos grandes shows, não conseguem gravar, assédio etc. Então resolvi diminuir meus textos e dar duas páginas para cada uma, uma página com um texto escrito por elas e a outra página uma foto, comecei a pesquisar nas redes, enviava mensagens pedindo para falar do projeto, enviei para mais de 400 guitarristas, algumas não aceitaram e muitas não responderam, mesmo assim cheguei em 210 brasileiras e convidei 15 guitarristas de vários países.

– Há previsão de lançamento?

Era pra ser um livro escrito só por mim, imaginei oferecer a uma editora em setembro/outubro de 2017, como tudo mudou com a participação das 225 guitarristas, tive que esperar todas enviarem seus textos e fotos, terminei quase dois anos depois, agora os textos estão sendo revisados e alguns traduzidos, não tenho uma data para o lançamento, mas imagino para o primeiro trimestre de 2020.

– Como encontrou as guitarristas e como foi feito o contato com elas?

Pesquisa nas redes sociais e no Google e algumas indicaram outras. O contato foi feito por envio de mensagens no Facebook e Instagram. Teve muitas conversas pelo Whatsapp também.

– Qual critério utilizou nas entrevistas?

Quando pediram pra falar e alegaram os motivos criei um texto pra servir de referência e ajudá-las a escrever e desenvolver seus textos, algumas perguntas básicas, sempre deixei claro que não era um livro sobre virtuosas, nem sobre bandas, discos e sim sobre a relação da mulher com a guitarra.

– Pretende dar sequência ao livro?

Sim pretendo, na verdade já comecei a pensar na sequência. Algumas baixistas e bateristas perguntaram se pretendo escrever sobre elas…claro que sim!

– Você já enfrentou algum tipo de resistência, por ser um cara escrevendo sobre mulheres no rock?

Fui questionado por duas ou três meninas, uma delas uma guitarrista punk mal educada e inconformada com o livro, inconformada com um homem querendo falar de mulheres, fazendo um discurso no meu inbox, pedi então pra ela escrever esse discurso no livro pra não ser um discurso a serviço do nada, pois só eu iria ler, aí a coisa piorou, disse que os homens deveriam manter distância das mulheres e coisas piores. Só não entendi porque na banda dela só ela é mulher… enfim…

– Você já lançou discos de mulheres no Brasil, como foi escolher essas artistas em específico?

Lancei em 2013 um álbum da guitarrista inglesa de blues Joanne Shaw Taylor, em 2018 lancei o álbum da guitarrista de São Paulo, Gabi Gonzalez.

– Que dica poderia deixar para as meninas que estão procurando uma forma de lançar seus discos? Como se destacar?

É uma ótima pergunta, esse assunto está no livro, é um assunto importante que deveria ser mais explorado. Penso que, o que falta para quem está começando, querendo lançar discos é um diretor artístico, que foi substituído pelo “jabá”. A figura do produtor é importante, mas não é ele quem vende os discos, não é ele quem encara o mercado, os lojistas, os jornalistas, os radialistas e os consumidores, é preciso entender o mercado, os músicos são a parte técnica do negócio, o selo/gravadora é a parte comercial, ambos precisam estar alinhados nas ideias e o produtor produzir essas ideias, penso que esse é o melhor caminho.

– O que tem percebido no público que consome rock hoje em dia? 

O rock é um sessentão, é um estilo de vida, é cultura e foi contra cultura, é atitude, isso foi passado para gerações de bandas e consumidores, muita coisa mudou, modernizou, é preciso acompanhar essas mudanças, não deixar a chama apagar, veio a tecnologia, a facilidade e a rapidez de ter música sem sair de casa, o mundo digital, mas quando as bandas clássicas vem tocar, o público está lá, querendo ver o físico, o real, então o respeito continua o mesmo.

– E as pessoas que produzem rock, como você percebe o mercado?

Aí tem dois pesos, não gosto como o rock é produzido no Brasil nos últimos vinte anos (no mínimo), porém é melhor ter esse rock do que não ter nada, seria muito ruim uma década sem rock, sem bandas, sem histórias, a minha crítica é que padronizaram o rock, tiraram a criatividade, ficou nas mãos de alguns produtores que querem só dinheiro, não pensam em qualidade, no fim todo mundo perde com isso, menos meia dúzia de espertos.

– Em sua web radio, alguns programas são comandados por mulheres. Como está o projeto da rádio?

Criei a web muito em função do livro, quero tocar as mulheres cantoras e instrumentistas do mundo, hoje a web é 100% música, programas só com mulheres, discos e concertos na íntegra, tenho feito especiais com brasileiras e gringas sempre com depoimentos. Estamos produzindo pilotos de programas falados, de diversos assuntos, devem ser programas semanais, espero logo colocá-los em breve no ar. Vejo a web como uma ferramenta para novos projetos, as redes sociais permitem a nós conhecermos pessoas e rapidamente criar situações de trabalho. Não tem burocracia, elimina agentes e agências, é prático, acho isso muito interessante porque abre um leque de opções com pessoas a distância, isso vai ser comum num futuro bem próximo.

– Por fim, qual a regra número um do sucesso?

Olhando hoje pra 1992, vejo que tinha tudo pra dar errado, não tinha experiência e comecei a trabalhar com músicos renomados, com discografia, carreira, vencedores, músicos de sucesso e tudo deu certo, porque os discos eram bons, então o meu recado é esse, a regra número um é o “produto bom” técnica e comercialmente, não esqueçam disso.

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NO PALCO

– Qual o ‘cast’ dos sonhos para um Festival Rock Feminino? 

Algumas bandas antigas em atividade como Girlschool, Vixen, The Donnas, tem bandas novas como Burning Witches, Crucified Barbara, Jane Lee Hooker, Thundermother, Stonefield. Gosto de várias bandas femininas brasileiras, mas não seria justo deixar nomes de fora.

– Quais seriam as músicas do melhor CD de Rock Feminino de todos os tempos? 

Escolher 10, 12 músicas é muito difícil, tem muito rock bom, meu setlist estaria ligado a essas bandas acima.

– Quem seriam as integrantes da banda dos sonhos de Rock Feminino?

É uma pergunta mais difícil ainda porque seriam 4 ou 5 integrantes…vixi…pirei!

– Qual o melhor show que você já foi?

Vi muitos shows, James Brown foi arrasador, Jimmy Page & Robert Plant, Jeff Beck, Johnny Winter, Edgar Winter & Leon Russell, Van Halen, Eric Clapton, Jethro Tull…tá por aí…rs

– E melhor show que você ainda não foi?

The Who e King Crimson

– Qual o artista que mais se orgulha ter trabalhado junto?

Trabalhei com vários, mas Jorge Mautner me deu a chance de lançar o primeiro álbum pela Rock Company e um álbum inédito.

– Qual artista ainda espera poder trabalhar?

Com muitas bandas femininas

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Vivian Guilherme

A autora é jornalista, mestre em Ciência, Tecnologia e Sociedade pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), graduada em Letras e pós-graduada em jornalismo contemporâneo. Produtora musical e técnica em áudio profissional, foi eleita Personalidade Musical do Ano (2008 e 2011) pelo Prêmio GRC Music (extinto Prêmio Toddy de Música). É criadora do Festival Rock Feminino e webmaster do Rockfeminino.com.br.

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